No poema "Morte do Leiteiro", do modernista Carlos Drummond de Andrade, é retratada a história de um entregador de leite que, ao ser confundido com um ladrão por seu cliente, acaba sendo morto a tiros. Esse tipo de cena não está restrita à literatura, e ameaça se tornar mais presente na sociedade brasileira caso o porte de arma seja liberado. Por esse motivo, é imprescindível discutir as causas da violência assídua no Brasil, que ocorrem, principalmente, devido à ineficiência estatal em garantir segurança pública e em ressocializar ex-presidiários. Nesses parâmetros, é contundente afirmar que o Estado brasileiro tem falhado no exercício da Constituição Federal, a qual delega ao Governo a preservação da ordem pública. Prova disso são os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que mostram um crescimento de 14% no número de homicídios praticados no Brasil, entre os anos de 2006 e 2016. Tendo isso em mente, é possível afirmar que, se o porte de armas for liberado, esse número só tende a aumentar, visto que, de acordo com o diretor do Ipea, Daniel Cerqueira, nos locais onde há maior difusão de armas de fogo, a taxa de homicídios cresce em 2%. Além disso, outra problemática que suscita a violência recorrente no Brasil é a improficiência do Estado em ressocializar pessoas privadas de liberdade, segundo consta no artigo 10 da Lei de Execução Penal. Essa incompetência estatal verifica-se nas cenas de prisões superlotadas, cercadas de violência e maus tratos, que ferem imensuravelmente o direito à dignidade humana. Por essas razões, é coerente pensar que o preso sai da cadeia "pior" do que entrou, disposto a cometer crimes ainda mais violentos. Esse pensamento é validado ao analisar o índice de reincidência criminal no Brasil: de acordo com o Ipea, um em cada quatro ex-condenados voltam a ser presos no país. Tendo em vista o supracitado, é coerente dissertar que a solução para o problema da violência no Brasil não é a liberação do porte de arma, mas sim uma gestão mais responsável do Poder Público. Portanto, os prefeitos e governadores deverão investir no policiamento civil, contratando mais policiais e comprando viaturas, visando diminuir a sensação de insegurança da população. Ademais, esses mesmos agentes deverão financiar a construção de mais cadeias, por meio de convênios com construtoras privadas, a fim de diminuir a superlotação e conferir tratamento mais humano aos presidiários. Dessa maneira, poderar-se-á alcançara paz, sem a necessidade das armas de fogo, distanciando-se de atrocidades irreversíveis como a descrita por Carlos Drummond em sua poética.