“Como é que irão viver os que virão depois, já que a única coisa que importa é o triunfo do agora? ” Esse questionamento do escritor José Saramago leva à conclusão de que há de fato, como afirma o pensador português, uma “cegueira da razão”. Nessa lógica, cabe analisar o atual cenário de violência e abusos sexuais infantil no Brasil. Este que é um problema de saúde pública, segundo a Organização Mundial de Saúde, por ser um fenômeno complexo, inserido em um contexto histórico-social de violência endêmica e com profunda raízes culturais. Em um primeiro olhar, percebe-se que, em sua grande maioria dos casos de abuso infantil, ocorrem pela própria família da vítima. Nesse sentido, é relevante pontuar que alguns fatores sociais têm sido apontados como responsáveis pela ocorrência desses casos de agressão, no entanto, não podem ser considerados determinantes, pois se pode constatar tais atos em famílias, em que não existem estes problemas. A ideia do imediatismo que, como defende Saramago, cega o pensar, compreende-se em uma sociedade que paulatinamente torna-se cega a tais acontecimentos. Aliás, não se pode negar que, os abusos também ocorrem em entidades governamentais e privadas responsáveis por prover cuidados substitutivos aos da família. Logo, verifica-se que, é dever de todos zelar pela proteção das crianças e adolescentes, não apenas obrigação do Estado. Outro fato, cuja perspectiva exige olhar atento, é o fato de que a constituição da atual sociedade pode ter levado aos casos de violência e de exploração sexual infantil. Isso significa que, uma sociedade machista e patriarcal transformou estes acontecimentos banais e cercado por uma “redoma de silêncio”. Vale ressaltar, neste caso, que a criança e o adolescente violentado não são resultado de seu próprio desejo. Em síntese, é uma relação de poder entre agressor e vítima, em que essa última é o elo mais fraco. É necessário, portanto, que o poder público estabeleça como meta o fim dos abusos e violência infantil no país. Para isso, torna-se imprescindível um trabalho conjunto com os meios de comunicação na propagação do tema, a fim de acabar com o silêncio sobre o tema e influenciar os diferentes públicos a denunciar e a participar de ações de prevenção e combate à violação dos direitos das crianças e dos adolescentes. Com o propósito de ampliar o foco dessas medidas, deve-se utilizar as escolas como microssistemas do atendimento social e psicológico, em ações de acompanhamento às famílias de forma preventiva aos abusos, a fim de cessar essa cegueira da razão.