Brás Cubas, o defunto-autor de Machado de Assis, diz em suas “Memórias Póstumas” que não teve filhos e não transmitiu a nenhuma criatura o legado da nossa miséria. Talvez hoje ele percebesse acertada sua decisão: a postura das pessoas em relação à produção dos resíduos urbanos é uma das faces mais perversas de uma sociedade irresponsável que se despe de valores e atitudes sustentáveis em nome do individualismo. Reverter esse quadro com base em ideias de reutilização, reaproveitamento e redução do lixo é um desafio para o Brasil. É preciso analisar, antes de tudo, o pensamento do indivíduo frente ao problema da geração de resíduos. Segundo o sociólogo francês Émile Durkheim, uma sociedade capitalista é dotada, naturalmente, de um “fato patológico” que destoa da consciência coletiva: o pensamento individualista. Assim, diante de uma sociedade baseada no estímulo ao consumo, as pessoas são instigadas diariamente, através de frequentes comercias, a substituírem seus bens por outros com nova tecnologia. Além disso, empresários, visando apenas o lucro, praticam a ideia da obsolescência programada, ou seja, produzem mercadorias com prazo de duração determinado. Ambos os fatos evidenciam a pouca preocupação do cidadão com o desenvolvimento sustentável. Além da atitude individual, é preciso considerar o aumento da população brasileira e a ausência de investimentos em políticas que tratam de resíduos. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, a população brasileira vai aumentar em cerca de 20 milhões de habitantes, o que aumentará também a produção de resíduos. Aliado a isso, têm-se nas grandes cidades brasileiras poucos e falhos programas voltados para a questão do lixo, como é o caso da coleta seletiva que atende poucos bairros nas cidades e é pouco difundida para a população, que tem pouco conhecimento acerca de ideias de redução, reaproveitamento e reutilização de materiais. Enfim, fica evidente que toda a população brasileira tem responsabilidade com relação à questão da grande geração de resíduos nas cidades. Para solucionar tal problema, cabe aos governos federal, estadual e municipal investimentos em programas de coleta seletiva e em órgãos públicos fiscalizadores, que através de investigadores profissionais poderão controlar a publicidade ofensiva ao consumo e fiscalizar produtos de empresas com duração de vida útil baixa. Ademais, a mídia deve cumprir sua função social de orientação na redução da produção de resíduos através de campanhas de conscientização de reutilização, reaproveitamento e redução, além de esclarecimento sobre os programas implementados pelos governos. Assim, a sociedade deve assumir papel ativo nessa luta para poderemos viver um futuro mais sustentável do qual Brás Cuba pudesse se orgulhar.