“Harry Potter” é uma obra escrita por Joanne Rowling, na qual existem criaturas mágicas chamadas elfos-domésticos, a exemplo do personagem Dobby, que é servo de uma conhecida família da narrativa, a Malfoy. Embora fictício, o romance apresenta uma temática real e que persiste intrinsecamente associada à realidade do Brasil: a escravidão contemporânea. À vista disso, para compreender e enfrentar esse desafio no país, faz-se necessário analisar tanto a eficácia das leis quanto a formação do Estado brasileiro. É indubitável que a questão constitucional e a sua aplicação estão entre as causas do problema. O Código Penal prevê reclusão e multa para empregadores que submetam seus funcionários à condição análoga à de escravo. O que se nota, contudo, é o não cumprimento dessa lei, haja vista que um número significativo de empresas, sobretudo as relacionadas ao agronegócio, ainda subjuga seus empregados a trabalhos forçados, a jornadas exaustivas e a situações degradantes. Prova disso é que, de acordo com a Fundação Walk Free, no Brasil, há aproximadamente 161 mil pessoas que trabalham, mormente em áreas rurais, em condições análogas ao regime escravocrata. Dessa forma, evidencia-se a importância da ampliação de ações estatais como forma de combate à problemática. Outrossim, segundo Joaquim Nabuco, acabar com a escravidão não é o bastante, é necessário destruir a obra deixada por esse regime. Nesse sentido, é possível perceber que o sistema escravocrata persiste, ainda hoje, sob a forma da desigualdade social. Em decorrência disso, muitos brasileiros que possuem pouca qualificação e que vivem em situação de miséria são atraídos por falsas promessas de emprego e melhoria de vida. Entretanto, esses indivíduos são levados para lugares isolados, onde têm seus documentos retidos e são submetidos a trabalhos em condições semelhantes à de escravos. Logo, proporcionar qualificação e retirar esses cidadãos da conjuntura de vulnerabilidade são medidas que se impõem. Destarte, a escravidão contemporânea é resultado da ainda fraca eficácia das leis e da permanência da obra escravocrata. Desse modo, cabe ao Ministério da Justiça elaborar um plano de implementação de novas delegacias especializadas no combate ao trabalho análogo ao de escravos, sobretudo, em áreas que mais necessitem, como as regiões rurais, a fim proteger e assegurar os direitos dos trabalhadores brasileiros. Além disso, empresas sem fins lucrativos, a exemplo do Sebrae, devem, por meio de cursos de capacitação gratuitos, qualificar e inserir os indivíduos socialmente marginalizados no mercado de trabalho, promovendo, por conseguinte, a ascensão social do grupo em questão. Talvez, assim, poder-se-á diminuir no Brasil, o expressivo número de “Dobbys” da vida real.