Título da redação:

Luta, substantivo feminino

Tema de redação: A cultura de estupro no Brasil

Redação enviada em 19/06/2016

Ao longo do processo de formação do Estado brasileiro, do século XVI ao XXI, o ideário machista consolidou-se e permaneceu forte, uma vez que o histórico patriarcal ainda influencia as relações de gênero. Diante desse fato, a culturalização da violência sexual à mulher – personificada na relativização do crime – reflete uma sociedade que, conquanto moderna, permanece refém de ideais opressivos e violentos. Nessa perspectiva, é válido analisar as consequências e atribuições da cultura do estupro e como esse fenômeno denigre a integridade física e social da mulher. É importante salientar que a cultura do estupro é o conceito que normaliza a violência sexual, seja pela alta recorrência, seja pelo panorama social. Segundo Friedrich Nietzsche, o homem real, desde o nascimento, é submetido a valores – elemento formador da cultura. De maneira análoga, homens não são educados, diretamente, a estuprarem, mas criam-se jovens imbuídos de um sentimento de superioridade em relação à mulher, um fator cultural, no caso, machismo. Decerto, a relativização do crime, bem como a dissimulação do discurso feminino são algumas das implicações diretas que reafirmam a banalização da violência sexual. Além disso, a cultura do estupro é visível nas imagens publicitárias que objetificam a mulher, nos livros, nos filmes e nas novelas que romantizam o perseguidor, por exemplo. De forma morosa, a ética e a equidade de gênero se tornaram alentos aos poucos crédulos na atual Bruzundanga. Com efeito, os crimes de estupro, em cada quatro casos, três ocorrem dentro da residência da vítima, o que denota como a vida privada ainda obedece a uma lógica machista em muitas famílias. Nesse viés, a violência parte de um conhecido, amigo, pai ou irmão, por exemplo, condição de parentesco essa que desencoraja a vítima a prestar queixas, visto que há um vínculo sanguíneo e afetivo que ela teme romper. Em contrapartida, os debates nas mídias sociais, em destaque, pelo movimento feminista, são primordiais à crítica ao estupro culturalizado. Discursos de ódio e comentários opressivos, contudo, tornaram-se comuns, como contraventores do feminismo, o que demonstrou que a herança patriarcal não define apenas o crime em si, porém cria raízes e organiza-se ideologicamente. Certa vez, Chimamanda Adichie, expoente da literatura africana e da luta pelos direitos femininos, relatou a importância de encorajar mais mulheres a se atreverem a mudar o mundo. Logo, é preciso uma primavera feminista, de mulheres para mulheres contra a cultura do estupro. Entende-se, destarte, que a normalização da violência sexual parte de valores simbólicos e cristaliza-se à medida que a sociedade não se atenta à urgência do problema. Por isso, uma medida plausível, por parte do Governo Federal, seria a conformação de delegacias especializadas nesse gênero de crime, aliado à Polícia Civil e de profissionais específicos, em que o apoio jurídico, psicológico e hospitalar seja garantido progressivamente em longo prazo. Ligado a isso, urge às escolas e às famílias o papel sinérgico de formar jovens mais tolerantes e isentos da base machista, por intermédio de psicólogos e professores, que enfatizem a igualdade de gênero em palestras, materiais disciplinares e produções culturais, com o intuito de amenizar e, futuramente, acabar com o patriarcado. Afinal, toda transformação é germinada primordialmente no intelecto humano. Luta, substantivo feminino passível de feminicídio por que ousou usar suas saias pela primeira vez.