No início, parecem feitos um para o outro. Após alguns meses juntos, no entanto, os quadros não são mais tão animadores. Um já ameaça o outro de morte. As brigas são constantes, se não diárias. Há tentativas de homicídio ou de suicídio. Esse panorama poderia muito bem representar um filme de ficção, mas é na verdade um retrato bem realista de muitos lares brasileiros. Os relacionamentos abusivos não são poucos e têm suas causas tanto em sentimentos socialmente compartilhados como em falhas na Justiça brasileira. É de suma importância, em primeiro lugar, analisar a proveniência social dos conflitos nos relacionamentos. As desavenças que surgem conforme o andamento de um relacionamento possuem origem, principalmente, na incapacidade dos parceiros em cooperar e em respeitar um ao outro. A esperança de um convívio saudável é quebrada, então, por comportamentos como o egoísmo e a dominância entre as partes. Tal fato revela a maneira pela qual a sociedade enxerga as relações humanas, influenciada pela mentalidade capitalista em vigor: não como uma realização coletiva ou pessoal, mas sim um mal necessário para a concretização de desejos e ambições particulares. Ao incorporar essa visão, as pessoas que pretendem construir laços entre si também já predestinam o seu fim. Ressalte-se, ainda, a baixa eficiência dos órgãos governamentais na punição dos casos mais severos de abusos em relacionamentos. A Constituição brasileira de 1988 prevê que o Estado tenha papel importante em manter em harmonia as uniões civis, mas isso não acontece nem se efetiva na prática. A lentidão com que correm os processos judiciais nas cortes do país é um grave fator para que casos de abuso e violência sejam esquecidos com o tempo, ou até extintos. Dessa maneira, ao mostrar descaso com seu compromisso maior, o de julgar, a omissão do Poder Judiciário abre margem para haver ainda mais conflitos nos lares brasileiros. Diante do exposto, ação conjunta e coletiva é imprescindível para a amenização dessa problemática. As instituições de ensino superior, institutos e universidades, unidos a ONGs contra a violência nos lares brasileiros, devem iniciar um projeto de desconstrução da visão social deturpada a respeito dos fins dos relacionamentos, por meio de palestras e eventos públicos, a fim de proporcionar um convívio mútuo e harmônico para as pessoas. Ademais, é dever da sociedade, já sensibilizada, reivindicar do Estado, em especial do Poder Judiciário, que acelere a tramitação de processos que envolvam uniões civis, para promover punições mais justas, em favor das vítimas do abuso e da violência doméstica. A partir disso, será possível obter uma sociedade mais pacífica e relacionamentos mais duradouros e saudáveis.