Título da redação:

Deixa disso camarada, me dá um cigarro

Tema de redação: O preconceito linguístico no Brasil

Redação enviada em 18/10/2018

No poema “Pronominais”, de Oswald de Andrade, o autor pretende distinguir a gramática do português falado pelo “bom negro e bom branco da nação brasileira”. Inserido no movimento Modernista da Semana de 1922, o projeto artístico-literário buscava redescobrir o Brasil para os brasileiros, emancipando-o culturalmente. Décadas se passaram, e o preconceito linguístico ainda permanece no país, reflexo de uma estrutura de poder e monopólio cultural de uma elite que assim o diz ter e ser. Assim, desconstruir a ideia de certo e errado dentro da ordem linguística, faz-se necessário para a edificação, de fato, de uma identidade nacional independente. Primeiramente, deve-se compreender a língua como um instrumento de dominação. Desde a época da colonização, uma das formas de subalternizarem os nativos brasileiros era por meio da proibição do dialeto local e sua substituição pela língua do colonizador. Por compor um dos caracteres identitários pelo qual um povo se reconhece, suprimi-lo era impor-se. Na contemporaneidade, troca-se o binômio colonizado-colonizador por pobre-rico, e tem-se a roupagem moderna da língua como ferramenta de supremacia. Exemplo disso é o vocabulário excessivamente rebuscado contido nas leis, que vão muito além do uso de jargões da área, e impedem que o cidadão comum compreenda com exatidão seus direitos e deveres contidos na Carta Magna. Em uma nação democrática, isso é um obstáculo à concretização da cidadania desses brasileiros. A despeito disso, a língua é usada por todo e qualquer brasileiro. Segundo o linguista Marcos Bagno, “a língua que falamos molda nossa forma de ver o mundo, e nossa forma de ver o mundo molda a língua que falamos”, e o povo brasileiro, sem dúvida, deixou sua marca no português galego, que foi tomando contornos tropicais, até ser a língua falada pelo Brasil hoje. Independentemente de seus sotaques e desvios, é importante ressaltar que a língua faz-se correta a partir do momento que cumpre sua função primária, qual seja, a de promover a comunicação entre as partes. Nesse ínterim, o preconceito linguístico que insiste em corrigir em alto e bom som o “me dá um cigarro” é um equívoco, reproduzido majoritariamente pela elite supramencionada em sua tentativa de dominação perante um grupo de pessoas que, simplesmente, não tiveram acesso aos recursos gramaticais mais adequados, em um contexto de desigualdade abissal que marca o país. Nota-se, portanto, que a língua pertence àqueles que a falam, e não deve ser classificada como certa ou errada, mas sim sob um ponto de vista de adequação. Para tanto, faz-se mister que o Ministério da Educação insira por por meio de decreto legal, uma coletânea de obras literárias brasileiras, tais como as regionalistas, de abordagem obrigatória no ensino da disciplina de português ou literatura, enfatizando as diferentes tonalidades que o português adquire no território nacional, a fim de promover seu reconhecimento institucional e romper com o estigma. Tal medida, objetiva validar tais variedades e minimizar o preconceito dos alunos como futuros cidadãos brasileiros, donos, verdadeiramente, de sua língua.