Buscapé, um jovem brasileiro, negro e pobre, sensível, amedrontado pela realidade violenta da comunidade onde mora, teme virar bandido. Entretanto, apesar da considerável pressão do meio em que vive, o rapaz, personagem principal do aclamado filme ‘Cidade de Deus’, consegue se livrar da sua sina graças ao talento nato para a fotografia. Contudo, o final feliz do protagonista não reflete a realidade atual da maioria dos jovens brasileiros, frequentemente vitimados por abusos físicos, emocionais e sexuais. Além disso, a falta de oportunidades de trabalho e estudo aumentam a vulnerabilidade desses jovens que, ao não encontrarem alternativas à criminalidade, não raro perdem suas vidas precocemente em decorrência da violência urbana desmedida. O impacto causado pelas agressões cometidas contra os jovens são socialmente muito relevantes, principalmente em países como o Brasil, uma vez que, segundo estatísticas do IBGE, cerca de 25% da população brasileira é composta por indivíduos cuja faixa etária varia entre 15 a 29 anos. Entretanto, apesar da expressividade demográfica e do fato de a juventude ser sinônimo de renovação e esperança, a realidade brasileira não permite o desenvolvimento adequado de boa parte desses jovens pois há décadas não existe governança nacional suficientemente eficaz para garantir educação, qualificação e emprego para essa parcela da comunidade. Em decorrência disso, há o surgimento de um subgrupo social denominado ‘nem-nem’, formado por jovens que não estudam e não trabalham. Consequentemente, uma vez desocupados, esses jovens ficam à mercê da criminalidade, tornando-se vítimas de um sistema falido e de uma sociedade conivente- realidade essa magistralmente exposta no longa-metragem ‘Cidade de Deus’. Ademais, um dos fatores agravantes dessa situação é o aumento da mortalidade de jovens brasileiros em decorrência da violência urbana: da ‘Chacina da Candelária’ às vítimas de balas perdidas no Rio de Janeiro, são incontáveis as vidas juvenis desperdiçadas por causa da insegurança e desorganização do país. Conforme o Atlas da Violência de 2018, publicado pelo IPEA, a taxa brasileira desse tipo de crime é cerca de seis vezes maior do que a taxa mundial, evidenciando, assim, que o Brasil é uma nação que não proteje seus jovens. E as provas disso, infelizmente, não são poucas: o número insuficiente de políticas públicas de combate aos homicídios de jovens, o avanço da criminalidade nos centros urbanos e as desigualdades sociais- mais acentuadas do que nunca- funcionam como combustível para a ocorrência de homicídios de jovens. Diante dos fatos, é angustiante perceber que o Brasil, ao negar direitos básicos aos seus jovens, desperdiça o potencial transformador natural da juventude e perde, dessa forma, uma grande oportunidade de desenvolvimento nacional. A fim de impedir que a violência retratada no filme Cidade de Deus se perpetue futuro à frente, torna-se imprescíndivel a realização de ações que objetivem o combate ao homicídio de jovens no Brasil. Para tanto, cabe ao Governo Federal, por meio da mobilização dos Ministérios da Segurança Pública e do Desenvolvimento Social, estabelecer um plano nacional para a redução da violência contra adolescentes e jovens. Complementarmente, deverá haver a mobilização dos Ministérios da Educacão e do Trabalho para a ampliação do número de vagas nos sistemas nacionais de educação e capacitação profissional, bem como a geração de postos de trabalho para a promoção da inclusão social de jovens. Dessa forma, ao protejer e investir no desenvolvimento da juventude, o país garante um futuro melhor àqueles que, da mesma forma que Buscapé, precisam de apenas uma oportunidade para ter uma vida melhor.