Título da redação:

Desafios à Humanização dos Serviços Médicos

Tema de redação: Humanização no Atendimento à Saúde.

Redação enviada em 24/07/2015

A humanização é considerada um tema moderno, a despeito de ser milenar. No clássico literário “The Physician,” por exemplo, conceituado por representação fidedigna da realidade da época que retrata, o autor Noah Gordon apresenta os médicos europeus do século XI como desinteressados nas condições de seus pacientes e as condições precárias com as quais lidavam. Do início do milênio passado até o atual, a humanização do atendimento à saúde adicionou mais um desafio a vencer: o modelo científico de pensamento, voltado a hipóteses, estatísticas e dados – mas não a impressões humanas – que passou a justificar a carência generalizada de empatia entre profissional da saúde e paciente. A humanização, a capacidade de oferecer qualidade de atendimento combinando tecnologia a bom relacionamento entre profissional e paciente, é algo difícil quando há descaso tecnológico porque incapacita o profissional. Por exemplo, diante da falta de medicações cedidas pelo Estado e da incapacidade de indivíduos pobres de comprá-las, não há razão para que o médico sequer as receite; e se não existem exames diagnósticos que especifiquem a doença, o profissional muitas vezes não pode tratar a pessoa porque o tratamento errado pode piorar o quadro patológico. Assim, a condição de miserabilidade na qual alguns pacientes estão inseridos se torna um fator de desesperança do profissional médico que deveria atendê-los. Este, por sua vez, se torna expectador de tragédias humanas e, por autopreservação psicológica, fecha-se emocionalmente à condição que paradoxalmente deveria cuidar. A indiferença médica não se deve apenas à frustração acerca das condições sociais e trabalhistas impróprias com as quais um profissional pode conviver. Ela também pode advir da falha de caráter. Em seu livro, Noah Gordon apresenta os médicos europeus do século XI como mercenários. Isto se dá devido à exclusividade do conhecimento médico. O título de médico é tão raro que os onerários por serviços médicos são de alto custo, de pagamento restrito à nobreza. E a população comum deve se contentar com os barbeiros-cirurgiões, profissionais da saúde com conhecimento reduzido sobre medicina. Infelizmente, a situação ainda vigora hoje em dia, pois a classe médica continua restringindo o conhecimento a fim de manter o status de elite profissional, o que torna o acesso a médicos algo difícil e caro. A profissão se torna, assim, alvo de indivíduos que desejam dinheiro e que carecem da identificação com a atividade médica e das qualidades necessárias para execução da medicina humanizada. O pensamento científico é outro obstáculo à humanização dos atendimentos da saúde. Muitos médicos simplesmente não ouvem o que os pacientes lhes contam: as histórias dos pacientes. O Programa de Medicina Narrativa, da Faculdade para Médicos e Cirurgiões da Escola de Medicina da Columbia University, foi organizado em resposta à percepção de sofrimento – e até de mortes – que poderiam ser atribuídos parcial ou totalmente à atitude dos médicos de negligenciarem o que os pacientes falam. Os médicos em questão acompanhavam o paciente estatisticamente: seu ritmo cardíaco, seus hemogramas, sua temperatura e seus demais resultados de exames; mas não davam atenção à pessoa que eram. O Programa de Medicina Narrativa tem por objetivo criar empatia no médico, fazê-lo ouvir o que o paciente, e combater o pensamento apenas conforme o modelo científico. A citada faculdade não é a única organização que apela pela humanização do sistema de saúde, mas ações contra os três pilares que dão suporte ao comportamento devem ser tomadas para se ter sucesso. O primeiro passo é o investimento em condições de trabalho dignas a todos os médicos: em locais limpos, abastecidos de medicamentos e com suporte de exames diagnósticos de qualidade. O segundo passo é a ampliação do acesso à saúde, uma ação que o governo atualmente executa mediante o programa Mais Médicos; enquanto o projeto é louvável em curto prazo, atitudes como ampliação dos números de vagas especificamente ao curso de medicina em faculdades e a transferência de funções exclusivas a médicos a outros profissionais da saúde – farmacêuticos, enfermeiros, biomédicos – seriam mais efetivas. Por fim, o ambicioso Programa de Medicina Narrativa, de conscientização dos médicos, é uma iniciativa apropriada, e que deve ser copiada, para mostrar aos profissionais a importância da empatia como ferramenta de trabalho dentro da medicina.